sábado, 30 de março de 2013

Redução fenomenológica - recursos do método


REDUÇÃO FENOMENOLÓGICA - RECURSOS DO MÉTODO

(Edmund Husserl: contra à "tese natural do mundo" ou visão cotidiana ou, contra as aparências das coisas exteriores contra, exatamente, ao que elas parecem ser.)

Entre grandes conflitos que surgem no horizonte da Europa contemporânea, a "humanidade europeia" encontra-se em um novo momento histórico (in: Europa: crise e renovação), assim, segundo Husserl, é necessário uma "nova maneira de se orientar diferente da orientação natural na experiência e no pensar". Para realizar tal tarefa, propõe em Ideias.. que podemos partir de um ponto-de-vista natural do mundo significando o fenômeno que se apresenta mas, não devemos nos contentar com este ponto de vista inicial. Husserl propõe, partindo na visão do mundo da vida, investigar o que se desvela diante do fenômeno que se apresenta, e assim, realizar o que chama de redução transcendental a fim de avançar para capturar a essência do fenômeno em observação, captá-la como o temos diante de nós algo como, "uma pura consciência", tal como se oferece à experiência psicológica imediata e, ainda mais, indo além dos pressupostos que lhe são aparentemente essenciais.
A "Redução Fenomenológica" é um método construido com o fim de derrubar barreiras tradicionais de investigação, diversificando a direção unilateral própria dos métodos tradicionais de investigações das ciências utilizados até o começo do século XX. Segundo Husserl, para assim obtermos o "livre horizonte dos fenômenos transcendentais purificados e descortinarmos o campo da fenomenologia" no sentido próprio  que o termo deve ser compreendido.
Enfático em Ideias..., Husserl observa que desta forma deveremos entender que a fenomenologia proposta, ou seja, "a fenomenologia pura ou transcendental não será fundante como ciência de fatos, mas como ciência de essências (como ciência eidética); como uma ciência que pretende estabelecer exclusivamente conhecimentos de essência e de modo algum de fatos".
Portanto, a redução fenomenológica de Husserl deverá levar o pesquisador: do fenômeno psicológico, à "essência" pura do objeto estudado, ou seja, do pensamento que forma juízos simples de universalidades enfáticas (empíricas), à universalidade do conhecimento das essências (proposto pela redução eidética). Porém lembra Husserl que a fenomenologia não deve ser uma doutrina das essências de fenômenos reais, mas, do fenômeno transcendental reduzido ( proposta da redução transcendental).
Os recursos do método podem ser entendidos "entre" duas etapas, a saber:
  • 1º) a redução eidética (a busca do sentido do fenômenos);
  • 2º) a redução transcendental (como é o sujeito que busca o sentido).

REDUÇÃO EIDÉTICA (Eidos)


A restrição aos puros fenômenos. Tenho a intuição do sentido, este, o primeiro passo do método, a intuição que o revela como uma possibilidade para captá-lo. Assim, se retirarmos um pedaço reduzimos, permanecendo uma outra parte. Redução a essência (Eide) pode dizer algo como: tirar a existência e colocá-la sob observação, ou seja, algo como, em vez de pedirem para descrever o que você vê, os "objetos" de sua experiência visual, considere que tivessem pedido a você para descrever seu ver dos objetos; desloque sua atenção dos objetos para sua experiência, além dos sentidos, ao Eidos, ou essência.
A redução eidética é a transição da atitude natural, na qual estamos direcionados a objetos materiais particulares, para a atitude eidética, na qual nos direcionamos para as essências.


REDUÇÃO TRANSCENDENTAL


Consiste em nossa reflexão a respeito do ato em si mesmo em lugar de seu objeto, assim, descobriremos em seguida que nosso estar direcionado ao objeto consiste numa complicada interação de três elementos, a saber: 1) as experiências estruturadas no ato - a noese 2) a estrutura correlata dada no ato - o noema; 3) as experiências supridoras e restritivas  - a hylé.
A doutrina husserliana sobre a redução transcendental foi sugerida na tentativa de construir conhecimento objetivando uma consequência sistemática, uma ordem entre os níveis de evidência; tal objetivo sistemático é que leva Husserl ao conceito de ego transcendental, este, não precisa ser afirmado em termos de conteúdo, mas é preciso conhecê-lo em sua necessidade imanente (em traços realistas); a redução transcendental não é uma busca "arbitrária" de apoio, como por exemplo, para as teorias contemporâneas tal qual a do movimento existencialista.
Nos parece que aqui Husserl se lança com certa radicalidade e uma universalidade acentuada que está para além, também, da solução kantiana da oposição entre realismo e idealismo de tal modo que para ele não existe mais sentido algum falar de elementos realistas no interior do idealismo, ou seja, podemos dizer: é correto colocar a redução transcendental ao nível de um certo idealismo que é possível deduzir de uma análise da consciência um conteúdo comum, sem necessitar, nesse contexto, de nada que não seja o essencial, o idealismo fenomenológica não conhece um "ideal" para a dedução. Como escreve Husserl em Ideias: "O real não é nada em sentido absoluto..., ele tem a essencialidade de algo que por princípio só é intencional".
Na redução transcendental a distinção entre essência e fato e o recurso à evidência do que é dado corporalmente na intuição das essências não satisfazem ao conhecimento, é necessário uma evidência adodítica (fundamentação última) e, somente assim, é possível conquistar uma ordem estrutural das evidências que faz jus à requisição de uma filosofia como ciência rigorosa. Portanto, o ponto de partida para a redução ao ego transcendental abarca as relatividades que estão estabelecidas - "no mundo da vida" - na pluralidade dos mundos históricos (conhecimento universalmente compartilhado) e no horizonte do mundo particular (experiência individual e atual do mundo particular).




Exercício de Redução Fenomenológica, para utilização do método - em Ciências Humanas: a fim de investigar sobre o que é Ser humano:
  1. A fim de analisar a existência do Eu particular: é possível considerar a existência do Humano fora da perspectiva de um Ser em relação?
  2. A fim de encontrar uma comprovação científica para o "conhecer a si mesmo ": existe algo (além do próprio Ser) que comprove (para além das concepções da própria psique e da relação sujeito-objeto-sujeito) a existência do Eu separado da formatação de um corpo?   
  3. A fim de investigar a existência do Eu universal: pode existir autoestima, afastando o Eu de sua cultura natal, que satisfaça a todos os "tipos" de humanidades?

quarta-feira, 20 de março de 2013

Temas e conceitos na fenomenologia de HUsserl

  Temas

  • análise "clássica" da percepção;
  • distinção lógica entre expressão e significado;
  • intuição categorial e o a priori;
  • descrição da consciência interna do tempo (sentido de duração e de validade atemporal);
    • A doutrina do juízo e sua fundamentação;
    • Fenomenologia, neurociência e intersubjetividade.

    "...para não deixar surgir qualquer mal-entendido, quero indicar que a Fenomenologia exclui toda e qualquer Metafísica que opere ingenuamente com absurdas
    coisas-em-si, mas não toda e qualquer Metafísica em geral."
    (Husserl, Hua 1/38)
     

    Conceitos  trabalhados: (ordem alfabética).


Análise intencional: (Conf. de Paris Hua 1/19) " ...é o "desvelamento" das atualidades e das potencialidades em que os objetos, enquanto unidades de sentido, se constituem", e onde toda a análise do próprio sentido se realiza na passagem das vivências reais para os horizontes intencionais nela pré-delineados.
 
Apodítica: (Ideias, §137) "ver com clareza uma essência ou estado-de-essência... no conhecimento da necessidade do ser assim de uma individualidade posta". Necessário como fundamentação última. (uma necessidade lógica, que não tem, necessariamente, necessidade de ser demonstrada).

 As "coisas mesmas": são as coisas visadas e experimentadas no preenchimento de atos intencionais enquanto tais; coisas visadas que são "vistas" "imediatamente", e não representadas por sinais e símbolos.

Atitude natural: para Varela, Thompson e Rosch (A mente corpórea, 1991 p. 40) podemos associar este conceito a atitude que vulgarmente é conhecida por "realismo ingênuo", que segundo os autores consiste na: "convicção de que não apenas o mundo é independente da mente ou da cognição mas igualmente de que as coisas geralmente são aquilo que apresentam."

Ato: experiência intenciona, porém, desvinculada da ideia de um tipo específico de atividade. Segundo Husserl (I. L., 2012 - <354>) cada ato ou é uma representação da consciência, ou tem representações como base.
Todos os atos possuem um conteúdo real, a saber, a própria intenção, compreendida como processo psíquico. Certos atos possuem, além disto, um outro momento real, a sabe um componente sensível (Hua 19/362, 391, 527-528).

Bedeutungsmässige Wesen: essência significativa.

Cogitare: "ação de estimular simultaneamente dentro (na mente) muitas coisas durante muito tempo, isto é, pensar...". (Confissões livro X cap. 11, Agostinho)

Cogito:  "eu tenho consciência de algo", " eu efetuo um ato de consciência" (Eu desperto!) (Ideias ... 2006, p. 88)
 
Consciência: normalmente designa-se os atos psíquicos como "atividades da consciência", como "relação da consciência com um conteúdo (objeto)" e, por vezes, defini-se diretamente "consciência " como uma expressão abrangente para atos psíquicos de todo tipo. (Investigações Lógicas, 2012 - <354>).

Constituição: movimento de reconstrução que se segue à redução realizada, (como é um conceito operativo cuja a essência pertence a fatos de eles mesmos, nunca torna-se temático e nem tem em vista qualquer modo de produção).

Eidética: às essências das coisas e não à sua existência ou à sua presença.

Eidos: a essência que se torna evidente mediante a redução fenomenológica. Em Ideias ...

Epoché: (Dic. Lalande) suspensão do juízo naquilo que diz respeito à existência das realidades do mundo, que constitui um aspecto da Redução Fenomenológica. Equivalente à pôr entre parênteses.  Para Dan Zahavi: "É de um significado decisivo não compreender mal a meta da epoché. Ela não é levada a termo com a finalidade de negar, de colocar em dúvida, de abandonar ou de excluir de nossa investigação a realidade efetiva, mas simplesmente com a finalidade de alijar ou de neutralizar um determinado posicionamento dogmático em relação à realidade efetiva, ou seja, a fim de que se esteja em condições de vislumbrar o fenomenologicamente dado - objetos, exatamente de modo como eles aparecem - de maneira mais estreita e direta. Dito em termos breves, a epoché significa uma mudança no posicionamento em relação à realidade efetiva e não uma exclusão da realidade efetiva. É somente por meio de tal alijamento do posicionamento natural que é possível alcançar um acesso à realidade efetiva que permita desentranhar seu sentido verdadeiro (Hua 8/457, 3/120, 8/465)" (In: A Fenomenologia de Husserl - pg. 68, 2015).

Erlebnis: vivências. Essência da relação existente na realidade objetiva da vivência. (vivência perceptiva - vivência rememorativa - vivência imaginativa - vivência judicativa).

Essência:  designou, "...antes de mais nada, aquilo que se encontra no ser próprio de um indivíduo, como o que ele é." (Ideias... 2006, p.35)

Evidência: (evidenz) - Einsicht (visão intelectual como algo evidente) pode ser originária e pura, assertiva e apodítica, adequada e inadequada, como uma clareza da visão: "unidade de uma posição racional com aquilo que a motiva" (Ideias... 2006, p. 305)

Experiência pré-predicativa: auto-evidência dos objetos.

Fenomenologia da coisa percebida: "Só há, porém, uma autorreflexão radical, que é a fenomenologia" (Hua 1/37). "...o que vemos de uma coisa é somente o lado que está voltado para nós e, mesmo contornando, não podemos alterar nada nessa relação essencial, ou seja, o fato de nunca vermos senão o "nosso" lado frontal, jamais o lado de trás". (OBS: é, em relação a algo visto como corriqueiro  pelo observador; a fenomenologia da coisa percebida deve ser realizada através da análise fenomenológica).

Gênese Ativa: a prática da consciência pela qual o eu intervém enquanto engendrado, criando e constituindo por intermédio de atos específicos do eu, ou seja, produzindo ou reproduzindo através de seus próprios atos os objetos de conhecimento;

Gênese Passiva: o "já formado", a partir do qual a tomada de consciência "superior" é possível.

Hua = Husserliana: edição (Hua .../...) o primeiro número indica o volume e o segundo o número da página.

Hylé: (termo grego para "matéria") são as experiências que temos tipicamente quando nossos sentidos são afetados, mas que também podemos ter quando temos febre ou somos afetados por drogas e coisas similares, assim,  a hylé deve suprir os componentes da noese e de modo correspondente do noema.

Ideação: "visão de essência possibilidade que não deve ser entendida como uma possibilidade empírica..."  (Ideias..., 2006 p.35).

Intencionalidade: (abud: Dreyfus, Follesdal, 2012 p. 108) Franz Brentano (1924), define este conceito entre: "um direcionamento de nossa consciência a um objeto", mas não apenas isto, segundo Brentano: "todo fenômeno mental se caracteriza por aquilo que os escolásticos da Idade Média chamavam de in-existência intencional (ou mental) de um objeto, por aquilo que poderíamos chamar, ainda que de modo não inteiramente destituído de ambiguidade, referência a um conteúdo, direcionamento a um objeto (que aqui não deve ser entendido como significado uma coisa) ou objetivamente imanente. Todo fenômeno mental inclui em si algo como seu objeto, embora nem sempre da mesma maneira. Na representação, algo é representado: no juízo, algo é afirmado ou negado; no amor, amado; no ódio, odiado; no desejo, desejado, e assim por diante. Essa in-existência intencional é uma característica exclusiva dos fenômenos mentais. Nenhum fenômeno físico exibe nada semelhante a isso. Podemos, por conseguinte, definir os fenômenos mentais afirmando que são aqueles fenômenos que contêm um objeto intencionalmente em si mesmo." Intencionalidade: (Hua 1/13) "Intencionalidade é a propriedade fundamental dos modos de consciência - pertencem também a este 'estado' da consciência os modos de ser, (enquanto tal) como: o ser, o ser presumido, o não ser, o ser-aparente, ser-bom, ser-valor, etc." Intencionalidade é o tomar consciência da "produção" de um sentido, podendo ser considerada como o fundamento do compreender. (Hua 19/59) "No significado constitui-se a referência ao objeto. Portanto, usar uma expressão com sentido e se referir a um objeto expressivamente (representar o objeto) é uma e a mesma coisa." (Zahavi, 2015, p. 37). Para Dan Zahavi "na análise da estrutura essencial da consciência, Husserl concentra-se, particularmente, em um grupo de vivências, que são todas determinadas pelo fato de a consciência ser sempre consciência de algo, ou seja, pelo fato da consciência estar sempre dirigida para algo, um objeto. Essa propriedade também é designada como intencionalidade. Não se ama, teme, vê ou julga meramente, ama-se algo desejável, teme-se algo ameaçador, vê-se um objeto e julga-se um estado de coisas. Independentemente de se o que está em questão é minha percepção, meu pensar, meu julgamento, minha representação, meu duvidar, minha expectativa, minha lembrança etc., todas essas formas de consciência são determinadas pelo seu tender para o interior (in-tendere) de objetos, e não se pode falar deles, sem inserir aí concomitantemente o seu correlato objetivo, isto é, o percebido, o duvidado, o esperado etc." (A Fenomenologia de Husserl, 2015 p. 22). A intencionalidade é caracterizada por sua independência da existência de um objeto visado. Não é consequentemente a existência do objeto visado intencionalmente, que torna um ato intencional, seja esse ato, perceptivo ou alucinatório. A consciência não se torna primeiramente intencional por meio de um efeito externo e ela não perde sua intencionalidade, quando seu objeto deixa de existir. Intencionalidade não é nenhuma ligação externa, que só chegaria a termo por meio do efeito de um objeto existente ela é muito mais uma propriedade intrínseca à consciência. Intencionalidade não pressupõe a existência de duas coisas diversas - consciência e objeto. A única coisa que efetivamente precisa existir é a vivência intencional, cuja estrutura própria inclui o estar dirigido para um objeto (Hua 19/386, 247).Para Francisco Varela: "a utilização do termo intencional não deve ser confundida com a sua utilização para significar - fazer qualquer coisa propositadamente." (A Mente Corpórea, 1991 p. 40).
1) Intencionalidade temática (mediata): é o saber do objeto e saber deste saber sobre o objeto;
2) Intencionalidade operante ou "em exercício" (imediata): é a visada (tomar consciência) do objeto em ato, não ainda refletida. A primeira esforça-se para alcançar a segunda que a precede sempre, mas sem jamais consegui-lo alcançar. 

Intersubjetividade: (tipo de intencionalidade que age em nossa experiência, de/ou sobre, outras pessoas).

Intropatia: pôr-fora-de-validade o abstrativo sobre os outros e de todos os estratos de sentido do meu mundo circundante que para mim crescem a partir da validade da experiência dos outros. (Hua 1/35). Uma autêntica explicitação fenomenológica da operatividade transcendental do conceito de intropatia: (Hua I/35) "como um pôr-fora-de-validade abstrativo dos outros e de todos os estratos de sentido do meu mundo circundante que para mim crescem a partir da validade da experiência dos outros. Precisamente por isso se separa, no domínio do 'ego' transcendental, isto é, no seu domínio de consciência, justamente o seu ser 'egológico' especificamente privado, a minha peculiaridade concreta, como aquela a partir da qual, a partir de motivações do meu 'ego', capto o meu análogo na intropatia...Posso captar direta e genuinamente toda a vida de consciência própria como essa mesma, mas não a vida alheia: o sentir alheio, o percepcionar, o pensar, o sentimento, o querer. Todavia, em mim mesmo tudo isso é co-experienciado, num sentido secundário, ao modo de uma apercepção de semelhança inteiramente peculiar... Contudo, o que aí se indica quando realizo uma 'autoexplicitação fenomenológica' e com isso, uma explicitação do que está aí legitimamente indicado - é uma subjetividade transcendental alheia; o ego transcendental põe em si, não arbitrária, mas necessariamente, um 'alter-ego' transcendental. Precisamente por isso se alarga a subjetividade transcendental a uma intersubjetividade, a uma sociabilidade transcendental-intersubjetiva, que é o terreno transcendental para a Natureza intersubjetiva e o Mundo intersubjetivo em geral, e não menos para o ser intersubjetivo de todas as objectualidades ideais..."

Intuição: o dado corpóreo do percebido enquanto tal. A uma forma de intuição que é direcionada a objetos físicos e chamada por Husserl de percepção e, nenhum outro ato (intuitivo) fornece evidência de como é o mundo.
Intuição empírica: " ...e, em especial, experiência, é consciência de um objeto individual e, como consciência intuitiva - é ela que traz o objeto à doação": como percepção, ela o traz à doação originária, à consciência que apreende "originariamente" o objeto em sua ipseidade "de carne e osso" (Ideias para uma fenomenologia pura... p. 36).
Intuição de essência (introspecção filosófica) "é consciência de algo, de um objeto, que é "dado" como sendo "ele mesmo", mas também, é consciência daquilo que então pode ser pensado de maneira vaga ou distinta..." (Ideias..., 2006 p. 37).

Lebenswelt: mundo da vida (as raízes de nossos conceitos, ideias, enunciados conscientes).

Mundo da vida: o mundo previamente dado. Mundo no qual a vida se inscreve com uma obviedade previamente dada, e que jamais se torna ela mesmo objeto de si mesmo.
Segundo Francisco Varela, este conceito para Husserl quer dizer : "o mundo social de todos os dias, no qual a teoria é sempre dirigida para um fim prático." (Em: Varela, Rosch (2001) - A Mente corpórea, p. 42)

Noema: (objetos intencionais visados) Husserl concebe o conceito de Noema em resposta a seguinte pergunta: de que modo o ato se relaciona com o objeto visado? "o núcleo do sentido"(transcendente) de um ato ou expressão de uma proposição. (Em: A Lógica dos sentidos - dupla causalidade - Deleuze, 2011). Os puros predicados, como por exemplo: a cor noemática em que não intervém nem a realidade do objeto nem a maneira segundo a qual temos consciência dele. O "noema" é uma estrutura que é associada com cada ato, correspondendo a todas as "prefigurações" (conscientes ou não) que extraímos tacitamente de nossa cultura e sobre as quais nunca pensamos. Ele (o noema) é transcendente, afirmou Husserl: "não é esgotado por nossas prefigurações, nem jamais será". Assim, no núcleo do sentido noemático encontramos alguma coisa mais intima que o próprio sentido, um centro transcendentalmente íntimo, que não é nada além da relação do próprio sentido ao objeto na sua realidade, relação e realidade (novamente) que agora devem ser engendrados ou constituídos de maneira transcendental como última estrutura do noema. (Husserl: em "Idéias para uma fenomenologia pura..." quarta seção - §100, §101, §102 e s.)

Noesis: (atos da consciência) com a sujeição do objeto à redução na atitude natural, o componente de postulação (opinião ou crença) a que pertence todo ato que confere ao objeto seu ser-caráter (por exemplo: real, possível, imaginário) torna-se acessível ao estudo neste conceito. Para Husserl, todo ato tem uma noesis, que é a contraparte da experiência do noema. Assim, noesis são as experiências estruturadoras, aquelas que atribuem estrutura, ou significado dado no ato, poderíamos considerar, a noesis como o elemento doador de significado no ato.

Ontologia formal: (Zahavi, 2015 - p. 57) "designa uma disciplina que investiga o que significa seu um objeto. Ela é considerada como uma disciplina formal, pois ela se abstrai de todas as determinações de conteúdo. Ela não está interessada pela diferença entre eixos, carvalhos e clarinetas, isto é, ela não se ocupa com as diferenças entre diversos tipos de objetos, mas com aquilo que vale incondicionalmente para todo e qualquer objeto em geral. A tarefa da ontologia formal consiste, consequentemente, na análise de categorias tais como as de qualidade, propriedade, relação, identidade, todo, parte etc." (Hua 3/37)

Ontologia material (ou regional): "investiga as estruturas essenciais, que pertencem respectivamente a uma determinada região ou a um determinado tipo de objeto e busca determinar aquilo que vale como necessidade para todo e qualquer objeto dessa região. O que caracteriza, por exemplo, os objetos matemáticos enquanto tais em oposição aos processos físicos ou aos objetos físicos? Cada um desses três tipos formaria, segundo Husserl, uma região particular ontológica com as suas próprias determinações características. A região dos objetos físicos pode, por sua vez, seu uma vez mais dividida em regiões mais especializadas tal comoo âmbito do químico, do biológico etc."(Zahavi, p. 57)

Percepção: (Varela, Rosch (2001) - A mente corpórea, p. 105) "significa basicamente a consciencialização, em especial a consciencialização do processo de cognição". A Percepção é uma vivência, um processo temporal da consciência, e seu conteúdo real é constituído a partir de fases ou momentos, que determinam juntos o ato concreto 'enquanto' processo psíquico (Hua 19/411).

Produção em relação à coisa percebida: produção de seu sentido de validade.

Psicologia: (Ales Bello, 2004 - Fenomenologia e ciências humanas, p. 22), composta por dois termos de origem grega: psique = alma ; logos = pensar + falar = coerência. Reflexão a cerca da alma.
 
Psicologismo: é a reivindicação de que coisas lógicas, verdade, verificação, evidência e raciocínio são simplesmente atividades empíricas de nossa psique. No psicologismo a razão e a verdade são naturalizadas. As leis da verdade e da lógica são tomadas por serem leis empíricas de alto nível, que descrevem como nossa mente funciona; elas não são vistas como constituintes dos muitos significados da verdade e da razão. Zahavi (2015 p. 14) "O cerne da argumentação psicologista é o seguinte: as questões epistemológicas e teórico-científicas dizem respeito à natureza cognitiva do perceber, do crer, do julgar e do conhecer. Todavia, todos esses fenômenos psíquicos e, por isto, é evidente que precisa ser uma questão da psicologia investigar e constatar sua estrutura. Isto também é válido para a nossa fundamentação científica e lógica, e a lógica precisa ser considerada, por isto, em última instância, como uma parte da psicologia, e as leis como legalidades psico-lógicas, cuja constituição e validade têm de ser constatadas por meio de investigações empíricas (Hua 18/64, 18/89)." O erro fundamental do psicologismo é o fato de ele não distinguir claramente entre o objeto e o ato do conhecimento. Enquanto o ato é um processo psíquico, que transcorre no tempo e possui um início e um fim, o mesmo não é válido para os princípios lógicos ou para os objetos matemáticos, que são conhecidos (Hua 24/141).
 
Redução: o retorno que rejeita toda teoria e toda construção metafísica à dação fenomenal enquanto tal. Se eu tirar um pedaço, reduzo e permanece uma outra parte.

Redução transcendental: "...apesar de époche e redução estarem estreitamente ligadas uma com a outra e serem parte de uma unidade funcional, Husserl designa vez por outra a époche como a condição de possibilidade da redução (Hua 6/154). Por isto é necessário diferenciar os dois: époche é a designação para o nosso alijamento de um posicionamento metafísico ingênuo, e ela também pode ser comparada, com isso, com um portão de entrada filosófico (Hua 6/20). Em contrapartida, a redução é a designação para a nossa tematização da correlação entre subjetividade e mundo. Ela é uma análise longa e difícil, que reconduz (re-ducere) da esfera natural para o seu fundamento transcendental (Hua 1/61). Tanto a epoché quanto a redução podem ser consideradas, consequentemente, como elementos de uma reflexão transcendental, cuja a finalidade é nos libertar de um dogmatismo natural (ou naturalista) e nos tornar conscientes de nossa própria realização constitutiva (isto é, cognitiva, doadora de sentido)." (Zahavi, 2015, p. 69)

Ser verdadeiro (seja real, seja ideal) (Hua 1/23): "tem significado apenas enquanto correlato particular de minha própria intencionalidade, tanto da atual como a que está pré-delineada enquanto potencialidade".

Significado ideal: (Zahavi, 2015, p. 39): conforme Husserl, significado ideal é a essência da intenção concreta (Hua 19/106): "o significado relaciona-se com os respectivos atos do significar (a representação lógica em relação aos atos representacionais, o juízo lógico em relação aos atos judicativos, a conclusão lógica em relação aos atos conclusivos) como, por exemplo, o vermelho 'in specie' com as tiras de papel que temos aqui e que "possuem" todas o mesmo vermelho". O conteúdo real de um ato, é a individuação de um conteúdo ideal intencional, que também poderia aparecer de mesmo modo em outros atos do mesmo tipo, assim, enquanto o conteúdo real está literalmente contido no ato, uma vez que ele constitui o conjunto dos componentes do ato, o conteúdo intencional possui uma certa independência do ato concreto.

Sistemas intencionais: (abud Gardner, 2003 p. 92) A noção de um sistema intencional, conforme argumentações de Daniel Denett, não deve ser desgastada nem metafísica: "ela  não toca na questão da composição (do conhecer), qualidade, moralidade ou divindade de qualquer uma de suas efetivações. Sistemas intencionais funcionam como uma ponte entre o mundo das pessoas e das ações do senso comum e o domínio não intencional das ciências física-padrão."

Suspensão de todo posicionamento ontológico: isto é, de todos os objetos do conhecimento no mundo, o elemento não objetivo, o campo da subjetividade pura e de sua certeza apodítica.

Temporalidade:

Visão da essência (wesensschau): restabelecer perante todas as teorias construtivas o fato puro e simples de que conhecer é intuir. Conhecer é uma intuição "categorial" - foi assim que Husserl  denominou o visado: como aquilo que vem ao encontro como preenchimento da intenção do visar. (Ideias... "visão de essência também é, precisamente, intuição..." p. 36).

Vorstellung: representação.
Wesen: essência, ser.
Wesenserfassung: captação da essência.